Os tatuadores – 1

“— Quer marcar?
Era um petiz de doze anos talvez. A roupa em frangalhos, os pés nus, as mãos pouco limpas e
um certo ar de dignidade na pergunta. O interlocutor, um rapazola louro, com uma dourada carne de
adolescente, sentado a uma porta, indagou:
— Por quanto?
— É conforme, continuou o petiz. É inicial ou coroa?
— É um coração!
— Com nome dentro?
O rapaz hesitou. Depois:
— Sim, com nome: Maria Josefina.
— Fica tudo por uns seis mil réis.
Houve um momento em que se discutiu o preço, e o petiz estava inflexível, quando vindo do
quiosque da esquina um outro se acercou.
— Ó moço, faço eu; não escute embromações!
— Pagará o que quiser, moço.
O rapazola sorria. Afinal resignou-se, arregaçou a manga da camisa de meia, pondo em relevo
a musculatura do braço. O petiz tirou do bolso três agulhas amarradas, um pé de cálix com fuligem e
começou o trabalho. Era na Rua Clapp, perto do cais, no século XX… A tatuagem! Será então verdade
a frase de Gautier: “o mais bruto homem sente que o ornamento traça uma linha indelével de separação
entre ele e o animal, e quando não pode enfeitar as próprias roupas recama a pele”?”


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